Tuesday, March 24, 2009

 

Alfa-dependência




Está na nossa natureza animal-humana essa poderosa necessidade de criar e alimentar mitos, heróis, chefes, deuses, enfim, figuras alfa, que se seguem, se admiram, se imitam ou se temem.

Essa característica, algo que é comum no mundo dos animais gregários, gerando hierarquias, invisíveis mas poderosas, que permitem a coesão social e a reprodução e fortalecimento dos grupos, foi aproveitada desde sempre pelos líderes, políticos, religiosos e espirituais, para guiar os povos, por vezes para guerras estúpidas ou ritos abomináveis.

Modernamente, as democracias permitem que os povos sejam guiados por quem acham que elegem. Assim, elimina-se grande parte do potencial destrutivo da revolta contra quem manda. Quem realmente manda são os poderosos interesses instalados, por detrás de quem aparece e é apresentado à escolha popular. Os políticos que, uma vez eleitos, servirão quem realmente os escolheu para serem eleitos (e aparentemente escolhidos) pelo povo.
Se algum grupo ou candidato aparece como ameaçador para os interesses instalados, logo é patrocinada uma imitação que desvie atenções e votos, enfraquecendo aquele grupo ou candidato até que se torne inócuo ou perca a eleição.

A nossa alfa-dependência também cria e alimenta o star-system das artes. Quem não tem ou teve os seus adorados cantores, actores, desportistas, artistas das mais diversas habilidades?! Esta é em todo o caso a mais inocente a inócua das nossas manias (sendo extremamente lucrativa para muitos...).

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Monday, March 23, 2009

 

A beleza está em toda a parte

Um dos mais extraordinários enganos que nos impingiu a educação e o convívio humano é a limitação do entendimento do belo.

Dizem-nos que esta ou este é belo. E frequentemente é verdade.
Existem pessoas muito belas, cuja proximidade inquieta os outros, aqueles a quem a beleza não foi dada e obviamente a admiram como um bem.

Com o tempo, o nosso conceito de beleza tende a ser extremamente redutor.
Ora, na mais insignificante flor, no mais leve sopro de vento que com prazer aspiramos, no som da voz das pessoas que amamos, no bater acelerado do coração do amigo de quatro patas de pura alegria por nos rever, no sorriso feliz e gratuito que alguém nos oferece, na inacreditável cantoria matinal com que as aves saúdam cada novo dia, numa árvore tão seca que parecia morta mas onde despontam folhinhas verdes, por toda a parte existe beleza, uma beleza imensa, simples. Até na noite escura, nesse quase silêncio onde os nossos pensamentos voam e se esfumam, existe beleza.

Existem pessoas muito belas sim. Mas a extraordinária beleza do mundo não se esgota aí. Está em toda a parte, acessível a todos os que a queiram ver.

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O natural e o contra natura

Somos criaturas da natureza, que temos vindo a transformar e adaptar de acordo com os nossos gostos e necessidades.
Dominando grande parte da biosfera, influenciamos muitas outras espécies, em grande medida modificando para pior as suas condições de vida e diminuindo as suas possibilidades de sobrevivência.
Tendemos como todos outros seres a agir de acordo com a natureza, com a nossa natureza animal-humana.
Mas podemos agir também contra natura.
Age contra natura aquele que rouba, destrói e mata sem que isso seja causado por uma necessidade. O que assim procede pelo prazer perverso de destruir age contra natura, pois na natureza tal não existe.
Age também contra natura aquele que, apesar de esfomeado e perante o mais fraco a quem roubando podia sem risco conseguir alimento, se abstém de o fazer, por respeito e consideração pelo outro. Ou aquele que com risco da própria vida, intervém para salvar a vida alheia. Na natureza tal não existe. A necessidade do mais forte determina até onde pode ir: vai até à destruição do mais fraco, se tal for necessário.
Assim, o homem é capaz de comportamentos contra natura: uns infra-natura e outros supra natura.

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Ama

O conselho cristão para amar o próximo pode ter muitas leituras. O mais importante, porém, não é a compreensão racional do seu alcance ou bondade. O mais importante é a incorporação na nossa maneira de ser, logo, na nossa vida quotidiana, do impacto que esse conselho teve ou tem em nós.
Quase sempre se tem entendido o próximo como gente, pessoa que connosco interage num certo momento e lugar.
Acho que amar é mais vasto. Podemos amar animais, árvores, lugares, sei lá.
Outro dia, o meu pai mostrou-se, sem querer, que ama as árvores que plantou e diariamente cuida. Contou-me a origem e a história de várias, com uma ternura evidente e de repente, pegou num ramo próximo e deu-lhe um beijo. Um beijo de amor. Um gesto assim ensina mais sobre o que é o amor do que todos os livros.

O conselho pode até ser resumido numa palavra: ama.
Talvez não importe tanto o que amas, mas sim o desenvolvimento espiritual que te permite amar. Essa capacidade já vem conosco, como sementinha. Com sorte pode expandir-se e florescer, lançando o nosso perfume particular pelo ar a quem estiver próximo sim, ou mesmo longe, se longe chegar.

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Friday, March 20, 2009

 

Não entendo. Mas gostava de entender...

Porque é que, tendo vindo o trabalho humano a ser velozmente substituído pelo trabalho feito por máquinas, primeiro o trabalho físico depois o intelectual, as pessoas fixam como um objectivo número um das suas pobres vidas ter um emprego, para poder consumir, consumir até morrer?

Trabalhar, ou seja, continuar escravo para sempre. Criar penosamente filhos para serem os escravos de amanhã. Para quê? Para que os ricos fiquem cada vez mais ricos? As gigantescas organizações, começando nos Estados, passando pelas multinacionais, as grandes empresas, etc, cresçam, distribuindo benesses e lucros de milhões enquanto o povo simples passa mal?!

Não tenho nada contra a existência de ricos, muito pelo contrário. O que me choca é a
persistência da pobreza, a par do enorme progresso.

Produz-se hoje muitíssimo mais riqueza com muito menos esforço humano. Essa maravilha (o progresso científico e tecnológico) deveria permitir um novo mundo, novas formas de organização das sociedades, em que o trabalho pudesse voltar a ser visto como ele é: escravidão secular de que devemos libertar-nos.

Trabalhar é anti-natural, excepto se for feito por prazer, caso em que já não será trabalho mas lazer.

Perante a realidade próxima de que 80 por cento da população (dos países desenvolvidos) será excedentária, de que os empregos serão para os restantes 20 por cento, mesmo assim, os sábios vão defendendo que quem os tem devem permanecer neles até aos sessenta e cinco ou setenta anos (brevemente defenderão a reforma aos cem?...), continuando a ocupar, contrariados quase sempre, empregos onde as novas gerações não podem por isso entrar. Nem constituir família com alguma segurança, nem ter filhos acreditando num bom futuro para eles. Lá se vai a taxa de natalidade...

E dizem que os sistemas de segurança social não vão aguentar a inversão da pirâmide etc. e a sobrecarga crescente dos custos de pensões e de saúde. Acredito em absoluto que são TRETAS. Só seria verdade se os Estados não cumprissem a sua obrigação número um de Estados civilizados – garantir a todos uma vida digna de ser vivida. Depois, só depois, as grandes obras, os salários avultados, as regalias obscenas de alguns, as reformas douradas de outros, etc...

O Estados dizem sempre que não há dinheiro para aumentar as pensões miseráveis em mais do que meia bica por dia, mas desperdiçam incontáveis milhões em obras faraónicas, de mais que duvidosa utilidade. E não sabem nem querem saber de como emagrecer o seu próprio custo colossal de funcionamento.

Acredito que seria viável uma sociedade livre da escravatura moderna do trabalho estúpido. Uma sociedade cujos objectivos fossem bem claros: dar a todos os cidadãos uma vida digna. Esta deveria ser a prioridade número um de um Estado moderno e civilizado. Funções do Estado: a paz, o pão, saúde, habitação, educação (como na canção do Sérgio Godinho). Mas para todos.

Acredito que as pessoas, se devidamente encaminhadas e respeitadas, tem um enorme potencial criativo e de trabalho voluntário. Para tarefas e funções que para elas façam sentido e cujos resultados lhe deem alegria e sentido de realização.

Por isso, ao lado do mercado de trabalho, o Estado deveria criar um mercado social de trabalho, onde todos os que quisessem trabalhar teriam lugar, nas mais diversas funções e actividades, necessárias ao favorecimento da vida e elevação dos seus padrões de qualidade.

Mas todos os que não quisessem ou não pudessem trabalhar deveriam ter um rendimento social de inserção decente.

A par daqueles dois mercados, o Estado deveria incentivar e apoiar todas as organizações civis com fins não lucrativos, estimulando os cidadãos a nelas colaborarem de forma voluntária e gratuita.

O desemprego simplesmente não existiria. Todo o que quisesse trabalhar, trabalharia (nalgum daqueles três mercados – de trabalho, social, voluntário). Todo o que não quisesse ou não pudesse fazê-lo não o faria. Aceitaria baixar os seus padrões de consumo,mas teria sempre garantido o mínimo para uma vida digna. E poderia dedicar-se ao desporto, à criação literária, ao enriquecimento cultural, à criação artística, ao convívio com pessoas de interesses e gostos semelhantes, etc.


Tudo isto são obviamente fantasias minhas. Não entendo muito de política, embora saiba que tenho que sofrer as consequência das más políticas.

Por enquanto, assisto às tentativas de remediação do velho mundo, que entrou em convulsão e ameaça colapsar.

 

Bom dia!

Hoje bem cedo fui, como é costume, comprar um exemplar de maravilhoso pão alentejano. Na padaria, a fila à minha frente tinha duas mulheres e seis homens. Quebrei o silêncio com um sonoro bom dia!. Ninguém se dignou olhar, ninguém reagiu sequer com um leve movimento de lábios. Nada.

Isto, de ser tão comum, já não me incomoda muito. Acho estranho que as pessoas prefiram ser tratadas como coisas. Por mim, só para chatear, vou continuar a tratá-las como pessoas, dizendo bom dia todas as manhãs.

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Thursday, March 19, 2009

 

Dia do Pai

Hoje comemoro ser pai e ainda ter pai vivo.
Vivam todos os pais que sabem ser bons pais!

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Beja, hoje


 

Os males do mundo

Os males do mundo sempre existiram e foram imensos. As suas vítimas esquecidas são incontáveis. Guerras, doenças, cataclismos, fome, pobreza extrema, inumeráveis sofrimentos e injustiças foram uma constante da história humana.

O mundo moderno, com toda a sua parafernália de comunicação difunde (mostra à saciedade) agora muito mais e sobretudo imediatamente, alguns dos males do mundo.

Jornais e revistas, televisão e rádio e agora a internet, injectam-nos a cada dia overdoses de problemas.

Viciámo-nos no consumo dessas novidades, insensibilizando-nos para a realidade próxima pelo contacto repetido de imagens da realidade afastada.
Diariamente defrontados com problemáticas insolúveis, a nossa mente fica cada vez mais cansada e confusa de tanto se debater em vão. Essa impotência para resolver os problemas do mundo pode contagiar o nosso sentido do real. Ora o real, o nosso, é o real próximo, onde o nosso poder (autodeterminação, livre arbítrio) é vigoroso (e a nossa responsabilidade elevada). E não podemos perder isto de vista.

Considero-me co-responsável pelos meus actos e omissões conscientes, no domínio do real próximo e absolutamente irresponsável pelos males do mundo (o real afastado), contrariamente à opinião comum tantas vezes repetida de que “somos todos responsáveis” (pelos males do mundo).

Por isso, sou feliz e sempre fui (é a minha maneira de ser e eu respeito-me), apesar dos males do mundo. Durmo muitíssimo bem (se não tiver uma dor a chatear-me) apesar dos males do mundo.

Todos nós teremos, a seu tempo, a nossa quota parte de sofrimento (aliás foi o sofrimento que me ensinou que a ausência dele é ser feliz, só o não via).
O que for o nosso nos baste (por pequeno que fosse certamente nos bastaria, para fazermos parte da família humana, nesse seu vasto e incompreensível capítulo).

Se nos couber poder aliviar o sofrimento alheio concreto (diria real e próximo), façamo-lo e esqueçamo-lo. É em si mesmo recompensa bastante.

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Wednesday, March 18, 2009

 

Alfazemas de 2009, nos campos entre Mértola e Pomarão


 

Eu, em Mértola


Wednesday, March 11, 2009

 

A lei do mais forte

Provem certamente da nossa natureza animal, dominadora ora visível ora oculta das nossas acções e motivações, o uso e abuso do poder do mais forte sobre o mais fraco e mais ainda se este não pode ripostar de todo. Já pertence ao lado humano, preferir que o abuso fique no anonimato, livre da reprovação alheia (aos animais, o uso da força sobre o mais fraco não os envergonha nem um pouco e querem lá saber da reprovação alheia).

Graças à mente, capaz de raciocinar, ainda que grosseiramente, os mais fortes exibem quase sempre pretextos para o uso e abuso da força sobre os mais fracos. Tentativas de justificação quase sempre falsas e por vezes ridículas. Porque, implicitamente, o ataque do mais forte sobre o mais fraco é um acto de cobardia, excepto se se tratar de um imperativo de sobrevivência do indivíduo ou dos seus próximos. E tanto mais cobarde e vil quanto maior for a desproporção de forças.

A história humana foi feita do uso e abuso da força por todos os que se encontravam ou se achavam em posição de força para roubar, destruir ou matar os que lhes pareciam a jeito e convinham. Raramente esses ataques constituiram imperativos de sobrevivência. Mas, se vitoriosos, transformaram, aos olhos dos seus, muitos assassinos em heróis.

Não há nisso novidade. É a extensão humana de uma lei da natureza, implacável e cega à consideração e respeito pelo outro se este se encontra à mercê (Simone Weil gostava de citar o exemplo das galinhas que, se virem outra galinha ferida aproveitam para lhe dar bicadas. Conheci este exemplo: Dois cãezitos eram vizinhos e amigos. Um dia, um deles, distraído a dormitar no meio da rua, foi atropelado pela roda de um carro, sem muita gravidade. Mas ficou queixoso e a coxear. O outro, de imediato, correu para ele e deu-lhe umas dentadas, aproveitando a ocasião de fragilidade do vizinho. Daí para diante adeus amizade...


O que torna ainda mais belo, de uma beleza quase sobrenatural, o gesto daquele que, podendo destruir o outro, o que está à sua total mercê sem hipótese de ripostar, e estando até garantida a impunidade da destruição, se abstém de matar e destruir. Reconhecendo e devolvendo humanidade ao mais fraco, em vez da morte, dá-lhe um abraço.

Mas como as leis da natureza são implacáveis (o raio, o sismo, o tsunami destroem tanto homens bons como os assassinos) não está livre aquele que usa de clemência e de humanidade de que, aproveitando o abraço, o mais fraco lhe espete uma faca no coração e o mate.


Ora, sendo certo que Deus pode a qualquer instante destruir-nos e apesar da infinita desproporção de forças se abstém de o fazer, como ignorar que a nossa vida deveria ser essencialmente gratidão por esse belo gesto continuado? Um gesto que só pode ser classificado como um gesto de amor.
A vida, com toda a sua beleza e mistério, deveria ser aproveitada para aprender a amar Deus, correspondendo assim ao seu amor por nós.

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Friday, March 06, 2009

 

A crise - consumir ou poupar?

Nunca fui bom em números e o dinheiro não se dá bem comigo nem eu com ele. Estamos quites.


Ora, vivemos o tempo da crise do dinheiro e da economia em que os que não sabem (como eu) estão agora acompanhados pelos especialistas, que também confessam que nada sabem (de como endireitar o edifício).

Crise em que o mundo mergulhou, iniciada com a destruição das torres gémeas de Nova Iorque, seguida de guerras estúpidas e finalmente da derrocada surpreendente e escandalosa do sistema capitalista, a partir do seu centro, a Wall Street.


Eis os aspectos que mais perturbam a minha santa ignorância da economia, neste tempo de crise:


Assim, estão bem à vista as contradições das quais um sistema se alimentou: o sobre-consumo e a sobre-exploração dos recursos do planeta, o sobre-endividamento de todos, e a especulação financeira em larga escala que descambou em alta-vigarice. Em suma um estilo de vida insustentável, que a crise veio desmascarar.


E que dizer das empresas que, apesar do contexto de crise, apresentam lucros colossais? EDP, Galp, etc . Como é possível que não morram de vergonha os que de tal se orgulham, sendo certo que tais lucros se devem ao esbulho de milhões de pessoas (a minha conta da luz, em poucos anos duplicou, mantendo eu o mesmo padrão de consumo. Why?).


E segundo anunciaram os media, a dívida externa portuguesa cresceu de forma assustadora, atingindo uns 150 mil milhões de euros, uma coisa monstruosa. E o Estado, que também gasta desde há muito mais do que pode e vem dando o mau exemplo que todos alegremente seguiram (empresas e famílias), apresenta como estratégia para o futuro mais despesa, logo mais endividamento, nas tais ajudas aos desgraçadinhos dos ricos e na construção de infra-estruturas caríssimas – novo aeroporto, TGV e mais auto-estradas. Ora, toma!


Obviamente, tal como Cristo, que não sabia nada de finanças, também não percebo nada de economia, muito menos de finanças. (Salvem-se ao menos as criancinhas, que são o melhor do mundo, disse também o poeta. Quando crescerem, porém, como irão encontrar isto?!)


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