Wednesday, September 25, 2019

 

O tridente


A mente humana, instrumento maravilhoso de sobrevivência, tem três grandes recursos:

memória, razão e imaginação.

A memória é o principal recurso para lidar com o passado; a razão, para lidar com o

presente; a imaginação, com o futuro.

Apesar de ser um instrumento sem paralelo na natureza, pode ser bem utilizado (a favor do

nosso bem-estar interior) ou mal utilizado (contra o nosso bem-estar interior).

O caso da imaginação é o que melhor exemplifica o mau uso: não podendo a razão nem a

memória fornecer bases seguras para lidar com o futuro, uma vez que se trata do imponderável, o

incerto por natureza, em rigor, do que (ainda) não existe, apenas a imaginação pode ser utilizada

com alguma (aparente) utilidade.

Porém, quando a imaginação, em vez de pistas úteis, cria cenários angustiantes a partir de

experiências negativas anteriores e dos medos, tanto os individuais (medo de falhar, medo d e

enfrentar desafios superiores às nossas forças e outros medos de origem traumática) como os comuns

à nossa espécie (medo dos sofrimentos e da morte) então a imaginação joga contra nós e é geradora

de ansiedade e angústia.

Os três recursos da mente fazem lembram-me o tridente, que aparece por vezes, empunhado

por Júpiter (Zeus) da mitologia greco-romana e sempre por Shiva, na mitologia hindu.

 

Wednesday, September 11, 2019

 

O sonho do meu pai


O meu pai cresceu e viveu num tempo de condições de vida duras e exigentes. Tendo um filho único, que mostrava ser bom aluno e bom rapazinho, esteve sempre disposto a ajudar-me (tal como a minha mãe) para que eu pudesse prosseguir estudos, até onde nos fosse possível. Tudo correu bem e lá veio o dipoma de Direito, aos 23 anos. O conselho: “estuda que é para um dia seres alguém” foi seguido à risca.

Depois veio a vida, os trambolhões, os erros e os acertos. O tempo e as circunstâncias lá foram forçando a minha preguiça de lutar para “ser alguém”. Sendo um preguiçoso nato, “ser ninguém” para mim chegava bem.

A minha preguiça de resto resultava e resulta de perceber bem a futilidade de todo o esforço humano em perseguir sempre este e aquele propósito ou objetivos a que chamam sonhos, planos ou auto-realização. Eu, pelo contrário, nunca tive sonhos meus, só queria continuar vivo e sem sofrimentos de maior. Claro que desejava amar e ser amado, como toda a gente, mas achava que para isso não precisava de “ser (outro) alguém”, bastava ser quem já era.

Ter formação superior e ter vindo a ser advogado foi o resultado do sonho do meu pai, não um sonho meu. Mas fico grato pelo “empurrão”. Valeu o esforço e o caminho percorrido, tanto que vim até aqui e gosto de aqui estar.

Mas, para mim, continuo a ser “ninguém” e isso basta-me. Para os outros serei o que imaginarem e isso vai fora de mim e de tal não me ocupo. Quem gostar gostou, quem não gostar dançou.


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