Saturday, December 08, 2018

 

Realidade e Verdade



A realidade é deslumbrante. Geralmente não reparamos nela, tão entretidos que andamos, ocupados com o seu complexo sucedâneo: o mapa mental que dela fazemos, em permanente atualização.

A mente, esse instrumento utilíssimo, para nos guiar nas dificuldades e desafios do dia a dia, usando a memória colossal dos dias passados e talvez as memórias acumuladas nos nossos genes ao longo de milénios e usando ainda a sua capacidade extraordinária de projeção de futuros possíveis, esse que é o mais poderoso e complexo “objeto” conhecido da criação, se não soubermos geri-lo de forma equilibrada e com discernimento, pode tornar-se um perigo e um inimigo, nosso e dos outros.

Sob a realidade, de uma quase insuportável beleza, esconde-se porém algo sinistro: a verdade. Aquela que buscaram pensadores, filósofos e poetas. Poucos a encontraram e menos ainda tiveram a coragem de olhá-la de frente. Como o Sol, poderoso e incomparável criador e mantenedor das condições da vida neste planeta, também a verdade (da nossa condição humana) não pode nem deve ser encarada de frente, a olho nu – um fere a vista e pode cegar, outra fere o espírito e pode submergi-lo na desesperança.

Entretanto, somos donos do nosso olhar: podemos olhar para onde quisermos, enquanto nos for permitido (vi)ver. Por um lado temos o dever de olhar para nós e para os outros. Por outro, temos de fazer a escolha essencial: olhar a realidade ou olhar a verdade.

Depois de ter olhado a verdade de frente (como o filósofo), confesso que tive de desviar o olhar e voltar a deixar-me deslumbrar pela realidade (como o poeta). Escolho esta.

Mas não posso deixar de olhar, de vez enquando, de soslaio, a verdade (da humana condição, a minha e a de todos). Isso relembra-me e ocasiona em mim uma compaixão ilimitada por todos os que comigo se cruzam ou interagem. Todos, sem exceção, por mais vivos e brilhantes que se mostrem, não deixam de ser, como eu e todos os seres vivos, gado a caminho do matadouro.







Wednesday, December 05, 2018

 

Reflexões Privadas






  1. A vida é uma viagem. Uma viagem variada, de muitas paisagens e pessoas, encontros e desencontros, sonhos, trabalhos, sucessos e perdas, sofrimentos, nossos e alheios (e alguns nos tocam).
  2. Uma viagem para o matadouro.
  3. A qualquer instante, independentemente da idade ou condição, do pensamento ou disposição, pode chegar a nossa vez, com ou sem aviso prévio.
  4. Gostaríamos de ser livres e felizes. Impossível, tanto uma como outra. A nossa condição de gado a caminho do matadouro (que sabe, embora procure a todo o custo ignorá-lo), impede, em absoluto, ambas as possibilidades.
  5. E como poderia um ser humano ser feliz, sem ser um tremendo egoísta, se todos os outros seres humanos não pudessem sê-lo também?!
  6. A nossa mente foi criada com a capacidade de engendrar deuses. Temo-lo feito de forma bastante criativa, por toda a parte e em todas as épocas. Servem de orientação, proteção e consolo do espírito, que sabe, mas não pode aceitar, que somos gado a caminho do matadouro.
  7. Resta-nos apreciar a magnífica paisagem, de preferência em boa companhia e tentar aceitar (embora seja impossível), a nossa condição.
  8. Se pudermos amar, amemos. Se não, aceitemos cada um como é e respeitemos a sua viagem terrível (como a nossa).
  9. Pelo caminho, na nossa inconsciência, convidamos outros para viajar (filhos), recusando ver que estamos condenando mais seres ao final infeliz de todos.
  10. Isso nos torna cúmplices involuntários de homicídio.







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