Saturday, December 21, 2013

 

Passado e Vida




"Certo ou errado, uma coisa é boa sobre o passado: ele não existe mais". OSHO

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   A memória do nosso passado é um património individual instável. Estamos sempre a reconstruí-lo cada vez que o revisitamos. Mesmo assim, ele faz parte da nossa individualidade. Somos o desenvolvimento atual do que fomos e das circunstâncias em que fomos.

   O passado dos povos também sofre alguma instabilidade, porventura menor. Também ele está sempre a ser reescrito e reavaliado à luz de novas ideias e preferências. E também o presente dos povos é o desenvolvimento natural do seu modo particular de ser no espaço e no tempo, dadas as circunstâncias históricas concretas que tiveram de atravessar.

   Valorizo o passado, tanto individual como coletivo, apenas como homenagem às raízes do ser no tempo. Porém, interesso-me muito mais pelo que está vivo (os seres do presente) e não pelo que está morto (o passado e os seres do passado, ou sequer os que antes fomos nos nossos passados individuais).

    A vida, enquanto chama fulgurante e frágil, é o que me encanta. A vida que é e não a vida que foi ou a que eventualmente será.













 

Exupéry



"Si tu diffères de moi, mon frère, loin de me léser, tu m'énrichis"

Antoine de Saint-Exupéry


É uma belo pensamento poético, contrastante com a realidade.

Deveria ser assim: a diversidade encarada como um bem, uma ampliação das possibilidades e visões sobre o real.

Mas não é. Essa é mesmo uma tragédia ancestral e íntima do género humano: querer que o outro seja de certa forma e se o não for, hostilizá-lo. Quanto mais se afaste do desejado (geralmente o desejado é a normalidade vista pelo observador) mais será detestado. Eventualmente será perseguido ou mesmo morto, por ser demasiado diferente.



 

 

A loucura normal



"No primeiro capítulo, faço uma reflexão sobre o que quer dizer responsabilidade e confronto-a com o que normalmente é considerado a sua medida: o dever e a obediencia.A partir daí, chego a uma definição de loucura que diverge da preconizada pela Psicologia e Psiquiatria oficiais.A perspectiva destas últimas limita-se a apreciar o comportamento humano apenas com base no respectivo relacionamento com a realidade o que óbviamente, tem a sua razão de ser.Só que impede, assim, a aproximação a uma patologia menos evidente e mais perigosa, de cujo método próprio a dissimulação faz parte: a loucura que se encobre a si própria e se mascara de saúde mental.Essa não tem dificuldade em ocultar-se num mundo em que o engano e o ardil* são comportamentos adequados à realidade.
Ao mesmo tempo que os que já não aguentam a perda dos valores humanos no mundo real são considerados "loucos", atesta-se a normalidade àqueles que se separaram das suas raízes humanas.E é a esses que confiamos o poder, permitindo que decidam sobre as nossas vidas e o nosso futuro.Pensamos que eles têm a atitude certa perante a realidade e sabem lidar com ela; mas o "relacionamento com a realidade" de uma pessoa não é o único critério para determinar a sua doença ou saúde mental."


Arno Gruen, "A loucura da normalidade".



A leitura deste livro veio de encontro a uma velha suspeição: a de que existe algo de mentalmente errado com grande parte das pessoas ditas normais, que obtiveram sucesso na vida, sobretudo na política.
O modo como se relacionam com o real, aparentemente tudo dominando e sobre tudo tendo opiniões firmes e fundadas, sempre me mereceu grande desconfiança. Não se pode ser bom e sabedor em tudo, como os políticos fingem ser. Alguns fingem tão bem que se convencem a si próprios.
Quem se relaciona assim com o real, aparentemente dominando-o de modo eficaz, só pode fazê-lo sem o ver, mas guiando-se por um mapa mental superficial que o substitui. Nesse mapa as coisas e as pessoas são apenas pontinhos irrelevantes e descartáveis, caso necessário. 
De certo modo, os povos, onde se inclue uma grande quantidade de pessoas de qualidade e mentalmente saudáveis, são efetivamente guiados por um pequeno grupo de pessoas mentalmente perturbadas, com aquela perturbação perigosa, de aparência normal. Pessoas com a credibilidade reforçada pelo facto de serem muitas vezes bem sucedidas  nessa sua manipulação da realidade.
 
 














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