Saturday, August 28, 2021

 

A Era da Liberdade Minguante

O homem natural, das sociedades primitivas, não era livre, pelo menos tão livre como as outras espécies animais. Estas, para viver, sobreviver e reproduzir-se, sabem ou aprendem o suficiente, dotados que são de instintos apurados, inteligência ao nível da sua espécie e treino parental e grupal, por imitação, que lhes permite adaptar-se às contingências do meio, vencendo quase sempre (os soçobrando) as dificuldades da (quase sempre) exigente tarefa de viver. Mas, a mioor parte do seu tempo de vida é usufruto feliz da sua condição, de que a liberdade é parte substancial. O homem, a espécie mais sofisticada, de inteligência muito mais afiada, tem sentidos e instintos menos apurados e depende muito mais da proteção do grupo do que qualquer outra espécie. O bébé humano é totalmente dependente de outrém durante anos, para sobreviver. A dependência grupal, de grupos cada vez maiores e com organização social cada vez mais complexa, retira-lhe boa parte da sua liberdade, em troca da segurança do grupo, em face dos desafios gerais e particulares da vida e da sobrevivência. Um dos maiores perigos e ameaças são os outros grupos humanos. O conflito potencial ou efetivo é uma constante presença nas vidas de todos. As guerras e as aniquilações ou assimilações mais ou menos violentas (bem como a escravatura, de muitas formas), são uma constante da história humana. A violência cega e cruel de humanos contra humanos continua a ser um quadro atual em muitas partes do mundo, assegurando que, no essencial, o animal humano não mudou. Entretanto, o progresso científico e tecnológico dos nossos dias, aparentemente em vias de aceleração, obrigou à criação de leis, normas e regras cada vez mais e mais apertadas, para reger ambientes e realidades cada vez mais complexas. Ora, a liberdade é o céu sem nuvens, a tendencial ausência de regras. Sempre que se criam regras limita-se a liberdade. Esse processo contínuo, de uma verborreia legislativa diária, impossível de acompanhar mesmo pelos especialistas, mais não faz que, a par de tentar regular a realidade, limitar a liberdade individual e as liberdades coletivas. Supostamente em benefício da segurança dos indivíduos e dos seus direitos. E da certeza e segurança de todos. Não discuto a necessidade de regras, claras, gerais, compreensíveis e justas. Questiono sim a proliferação absurda de leis e regras, em todos os domínios, muito para lá do humanamente gerível. Como uma árvore que, sendo já gigantesca, continuasse a crescer indefinidamente, sem estabilizar num patamar de equilíbrio que lhe permita simplesmente ser árvore adulta, existir em harmonia com o meio (e dar frutos, em vez de simplesmente crescer). Quem sempre apreciou a liberdade, a sua e a dos outros, vê com algum desencanto a nossa era: a era da liberdade minguante.

This page is powered by Blogger. Isn't yours?